NOTA HISTÓRICA
SOBRE A
PARÓQUIA DE ALJEZUR
por Ruy Ventura
Há muitos séculos que a vida religiosa de Aljezur está
centrada na figura da mãe de Jesus de Nazaré, aqui invocada com o título muito
raro de Santa Maria d’ Alva ou Nossa Senhora d’ Alva. As origens etimológicas
do termo “Alva”, a toponímia da região, a lenda justificativa do nome da santa
e a sua religiosidade popular, associados ao envolvimento
histórico-antropológico do concelho, indicam que na base da invocação mariana
estão cultos muito antigos, com origem oriental.
A paróquia terá sido instituída após a integração de Aljezur
no reino cristão de Portugal – ocorrida por volta de 1249, após uma rendição
pacífica dos habitantes desta parte do barlavento do Algarve às tropas do
mestre da Ordem de Sant’ Iago da Espada (D. Paio Peres Correia). É muito
provável que a primitiva igreja matriz tenha resultado da adaptação ao rito
católico gregoriano da anterior mesquita islâmica da localidade. Na Idade
Média, o seu território era coincidente com a totalidade do vasto município
então fundado: da ribeira de Seixe às alturas da Serra do Espinhaço de Cão e
das escarpas do litoral atlântico ao cume da Fóia de Monchique.
Integrada em 1297 nos domínios santiaguistas, como sede de
uma rica comenda, essa igreja – situada a curta distância do castelo, na parte
cimeira de uma elevação importante – subsistiu até 1755. Nessa data, um
violento terramoto lançou-a por terra, deixando de pé apenas a capela-mor. Entre
uma e outra data, houve várias reformas e reconstruções no edifício. Entre elas
destacam-se as ocorridas na época manuelina (entre 1515 e 1518), no período
filipino (cerca de 1612/1613) e no reinado de D. João V (1725). De todas elas
restam ainda vestígios que se podem observar no Museu Municipal e na actual
matriz. No terramoto de 1755 pereceram ainda as ermidas de São Sebastião (do
século XVI) e de São Pedro (medieval).
Entre 1755 e 1809, a sede da paróquia de Nossa Senhora d’
Alva transitou por vários templos de pequenas dimensões, todos insatisfatórios
para as necessidades do culto religioso. Primeiro na ermida de Santo António
(1755-1757), depois na capela do hospital do Espírito Santo (1758-1790) e, por
fim, na igreja da Misericórdia (1790-1809), que mesmo depois dessa data teve
frequentemente a função de matriz complementar.
Só por volta de 1792, graças à decisão e aos esforços do
bispo do Algarve, se iniciou a construção de uma nova igreja matriz, num cabeço
situado a nascente da vila velha, denominado “Barrada” ou “Sílio”. O novo
templo, com uma volumetria monumental precedida por uma escadaria, foi
construído com os contributos de D. Francisco Gomes do Avelar, do Marquês de
Angeja (comendador de Aljezur) e da população, a partir de um risco atribuído
ao arquitecto Francisco Xavier Fabri. A sua sagração ocorreu em Setembro de 1809.
(Nesse ano se procedeu à profanação de outras igrejas da
povoação ainda abertas ao culto: Espírito Santo (fundada entre 1490 e 1517,
sobre o hospital onde descansavam os peregrinos que, do sul, seguiam para
Santiago de Compostela), Santo António (edificada na década de 1630) e Santa
Susana (situada a três quilómetros a sul da vila). Permaneceu até hoje com
culto regular o templo da irmandade da Misericórdia, edificado na década de 70
do século XVI.)
Trata-se de um edifício situado, estilisticamente, na
transição entre o Barroco e o Neoclássico. Tem capela-mor profunda, duas
capelas colaterais, transepto e três naves (sendo a central mais alta e mais
larga) onde existem mais duas capelas. O retábulo principal tem sido atribuído
ao farense José da Costa, a partir de um risco do arquitecto da igreja. Nele se
venera uma escultura imponente da padroeira, obra de um seguidor de José de
Almeida ou da oficina de Machado de Castro. Na capela do Santíssimo conserva-se
o sacrário barroco da antiga matriz, talvez obra do entalhador portimonense
Manuel Martins. Na das Almas existe um retábulo maneirista a representar a
coroação da Virgem e a Salvação das Almas do Purgatório. As capelas restantes
têm elementos provenientes do convento franciscano do Desterro, em Monchique,
aí colocados em 1846. Na capela de São Sebastião expõem-se os crânios de João
Galego e Pedro Galego, pai e filho, venerados desde o século XVI.
A igreja nova da Senhora d’ Alva permaneceu isolada durante
várias décadas. Com relutância a população correspondeu ao desejo do prelado
algarbiense, que sempre desejou criar junto da matriz refundada uma nova
povoação. Só na segunda metade do século XX a maior parte da população se
transferiu para o lugar da “Igreja Nova” (assim designado já em 1828),
esvaziando progressivamente as casas da vila medieval.
(Mais informações podem
ser lidas no livro “Memória
d’ Alva – Contributos para uma Biografia da Igreja Matriz de Aljezur”, de Ruy Ventura, à venda na igreja
paroquial.)